brasserie flo

    – Oh xente!

    – Gosta da calça?

    – Tá linda, menina!

    – Não parece ‘ma quenguinha, não?

    – Oh xente! De jeito nenhum! Que calça linda, menina! 

     

    O ambiente

    Não está de volta a 1997, a assistir a um diálogo entre Adriana Esteves e Eva Wilma na novela “A Indomada”. Não. Está em 2014 a ouvir uma conversa entre duas clientes da Brasserie Flo, um dos restaurantes supostamente chiques de Lisboa. Uma conversa incómoda para mim que a ouvi no volume 60; divertida para si que a está a ler com jazz como música de fundo. Uma coisa posso garantir-lhe: jantar ao lado de uma família numerosa de brasileiros nordestinos com muito dinheiro para gastar não tem nada de engraçado. E esse é um dos muitos problemas da Brasserie Flo: fica num hotel. Mesmo que esse hotel seja o Tivoli, em Lisboa. Os preços elevados, que antes serviam para seleccionar a clientela, hoje servem para atrair famílias de brasileiros, chineses, russos e angolanos. É isso que deve esperar encontrar aqui, entre uma decoração típica de uma brasserie parisiense, num estilo arte nova, e empregados com o grau de simpatia típico de um empregado parisiense, ligeiramente maçados cada vez que encontram um português normal e antevêem uma gorjeta razoável.


    O serviço

    Mal chegámos, nos últimos dias da Restaurant Week e seguindo uma sugestão tentadora que deixámos aqui no site, percebemos logo que a noite não ia correr pacificamente. A marcação online, feita e confirmada pela Best Tables, não existia no mundo offline (já é a segunda vez que isto nos acontece com a Best Tables). O livro de marcações foi confirmado, reconfirmado e triconfirmado até que o empregado, um pouco enfadado com essa invenção peregrina que é a Restaurant Week, aceitou que nós não teríamos inventado uma reserva e indicou-nos uma mesa (o restaurante, aliás, nem tinha metade das mesas ocupadas). Tudo isto se passou num tom de cordialidade, mas sem nunca entrar nesse terreno desconhecido que é a simpatia. E isso torna o restaurante num local pouco acolhedor e muito pouco simpático. Mas não é tudo. Também é um local ligeiramente incompetente: quando a garrafa de vinho que tínhamos pedido já ia a meio, avisaram-nos que não havia mais garrafas. E ligeiramente parado no século XIX: quando, antes de pagar, eu perguntei a outra pessoa na mesa se também ia querer factura com número de contribuinte, fui abruptamente interrompido pelo empregado…

     

    – Se é para dividir a factura em dois, digo-lhe já que é impossível!

    [Mas alguém lhe perguntou alguma coisa?! Ou lhe pediu para dividir a factura em dois?!]

    – Mas é impossível porquê?!

    – O sistema não permite.

    – Peço desculpa, mas isso é um absurdo. Frequentemente, eu peço para dividir a factura e todos os sistemas permitem. Se pedimos seis refeições, podemos dividir em seis.

    – Hmmm.

    – Traga-me lá então duas facturas, se faz favor…

    [Foi neste momento que percebi que a outra pessoa nem sequer queria factura, mas a interrupção do empregado foi irresistível]

     

    Quinze minutos depois, chegavam as duas facturas. Afinal, não era impossível, era só chato – e ali os empregados não estão para se chatear.

     

    A ementa

    O couvert

    É o melhor do restaurante. E, quando o couvert é o melhor que vem para a mesa, não se antevê nada de bom. O pão é uma chapata quente e estaladiça, que dá vontade de repetir até que o seu estômago encha como uma daquelas bolas insufláveis de praia. E a manteiga é Beurre d’Isigny, uma magnífica, saborosa e cremosa manteiga francesa. Imbatível!

     

    A sopa

    Foi nesta fase da refeição, quando tudo previa qualquer coisa de espectacular, que chegou a sopa de cebola gratinada. Cebola tem pouca, queijo para gratinar quase nenhum, mas pão tem muito. Resultado: enche, mas não agrada. 


    O prato

    Toda a mesa optou pelo famoso Bife Tártaro – já ouvi chamarem-lhe o melhor bife tártaro de Lisboa – e toda a mesa reagiu da mesma maneira: heeh… O que se pode traduzir por: sim, não estava mau, mas também não era brilhante. Na verdade, é um bife bem servido, mas com uma consistência demasiado densa. Os temperos não estão mal, mas também não surpreendem. No fundo, é o chamado bife à jogador de futebol: podia ter uma carreira brilhante, mas perdeu-se pelo caminho. Acabou como um bife tártaro igual a dezenas de outros. Pode ser que as ostras sejam fantásticas e que o risotto de vieiras seja divinal. Mas num bom restaurante tudo é bom – principalmente as especialidades, como o bife tártaro na Brasserie Flo. 

     

    A sobremesa

    O Religieuse de Avelã com Molho de Chocolate é um fantástico doce francês que mistura a massa de profiteroles com um creme de pasteleiro no interior e um molho por cima. É servido frio. E exactamente por isso é difícil de fazer: o creme tem de ser cremoso e sem vestígios de cacau em pó. Este estava com um creme pouco cremoso e onde se sentia perfeitamente os restos de pó. Comia-se mas, mais uma vez, não era brilhante.

    E isso é o pior que se pode dizer de um restaurante. Especialmente de um restaurante onde, numa semana de descontos se paga mais de 30 euros por pessoa.

     

    O bom 

    O pão e a manteiga

    O mau

    O serviço

    O péssimo

    A sopa de cebola gratinada

     

    Au revoir Brasserie, mais nous préférons toujours Paris (onde quer que ela esteja),

    Ele

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