em que restaurante japonês come sushi de ouriços do mar, gunkans de percebes ou canilhas flambeadas?

    Acredite que eu pensei bem nestas palavras antes de as proferir com a solenidade que o momento merece: este é um dos melhores restaurantes de sushi de Lisboa! Nenhum outro restaurante japonês da cidade consegue ter o nível de criatividade permanente do Tomo, mantendo uma fidelidade absoluta à tradição culinária do Japão. No Go Juu, por exemplo, pode provar um arroz mais solto e equilibrado, pode provar um divinal wasabi ou um deslumbrante peixe fresco, mas aqui a ementa varia com a mesma agitação com que os barcos de pesca atracam na Doca Pesca.

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    Aqui encontra gunkans de percebes a transbordarem sabor a mar, canilhas flambeadas no momento, sushi de ouriços do mar a desfazerem-se como um caviar sem tiques putinianos ou até mesmo uma interpretação das bruxas de Cascais à moda japonesa. Tudo sem os queijos-creme ou as maioneses aterradoras que inundam os restaurantes da moda. Os pratos são preparados com todos os cuidados mais tradicionais mas adaptando-se aos peixes e mariscos da costa portuguesa. O resultado é uma combinação absolutamente extra-terrestre de sabor e surpresa.

    Que o Tomo tinha nascido como um dos melhores restaurantes japoneses, fundado pelo rigoroso Tomoaki Kanazawa, já todos nós sabíamos. Agora que, depois da saída do chef japonês e depois de uma pandemia e muitos confinamentos, tenha conseguido manter toda a qualidade do início e continuado a inovar é uma novidade de nos deixar no nível de loucura de um Bruno de Carvalho à frente de uma mesa de DJ.

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    O ambiente

    Não é para o deixar a sofrer na expectativa que começo pelo espaço, é mesmo porque convém fazer um aviso prévio. Ensanduichado entre o Novo Banco e a Cross and Run Fitness Store, o Tomo pode facilmente ser confundido com um cabeleireiro ou uma loja de fotocópias. A entrada é discreta, abafada por dezenas de placas com nomes de clínicas de saúde, clubes desportivos, imobiliárias ou institutos de beleza. 

    Lá dentro, o ambiente melhora bastante. A luz é reduzida demais e as paredes forradas a madeira tornam-se muito pesadas, mas pelo menos tudo é mais tranquilo do que na Avenida dos Bombeiros Voluntários de Algés.  

    Pode optar por uma mesa mais sossegada protegida por paredes de madeira ou por um lugar na sala principal. Nós ficámos na sala. A decoração não é definitivamente o ponto forte do Tomo.

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    O couvert 

    Mal chegámos, e enquanto escolhíamos, trouxeram-nos para a mesa um bolinho de salmão fraquinho, frio e ligeiramente massudo tanto na cobertura frita como no recheio. Ao lado, veio uma sopa miso quentinha e saborosa e um atum cozido que estava seco e pouco agradável.

    No entanto, como diz o célebre provérbio japonês, “Shippai wa seikō no moto”… Não sabe o que quer dizer? Já lá vamos. Antes, precisamos de falar sobre…

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    …As entradas 

    Faça o que fizer, aconteça o que acontecer, não se limite a olhar para o menu. Pergunte sempre o que há de especial na ementa. São os produtos frescos que não estão disponíveis todos os dias, aquelas raridades que os pescadores e os mariscadores portugueses só conseguem encontrar de vez em quando.

    É nesses dias de sorte que pode provar umas divinais peças de sushi de ouriço do mar ou de bruxas de Cascais, um sashimi de lagosta ou de lavagante…

    Nós começámos o nosso jantar com uns inacreditáveis gunkans de percebes (€12 por duas peças). Basta dizer que é o meu marisco preferido para perceber como a minha boca se rasgou de orelha a orelha ao perceber que havia esta preciosidade. Grandes, carnudos e com um inconfundível sabor a mar, os percebes vinham com uma alga nori saborosa e um arroz de sushi exemplarmente temperado.

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    A seguir, chegou o Ika Mentaiko (€8,50) que se pode facilmente traduzir por umas lulas laminadas fininhas, cruas, carnudas e saborosas, acompanhadas por umas divinais ovas de bacalhau que, apesar de serem pequenas, provocam uma explosão de sabor a mar única a cada dentada. Uma entrada absolutamente obrigatória em qualquer visita ao Tomo.

    A festa continuou com outro palavrão delicioso. O Shake Kimuchi (€8,50) é um saboroso e fresquíssimo tártaro de salmão temperado com molho kimchi. Cortado em pequenos cubos, o salmão gordo e guloso combina na perfeição com o molho levemente picante.

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    Para fechar as entradas, veio apenas mais um delicioso atum. E umas gyozas. E um edamame. E umas canilhas flambeadas. E uns espinafres para acompanhar. Eu sei, não é pouca coisa. Mas a Família Mistério é numerosa e eu entusiasmo-me sempre que volto ao Tomo.

    O atum dá pelo nome cifrado de Maguro Nuta (€9,50) e trata-se de um extraordinário atum cortado em fatias grossas, levemente cozinhado por fora e totalmente cru por dentro. Se a qualidade do peixe não fosse suficiente para tornar este prato obrigatório, então fique a saber que ainda vinha coberto por um cremoso e suave molho miso e acompanhado por umas folhas de alho francês fininhas, ligeiramente crocantes e verdadeiramente viciantes: rimam os adjectivos e rima no seu estômago também.

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    O edamame (€4,50) podia ser banal, mas também consegue surpreender graças à deliciosa acidez picante do tempero feito de limão e gengibre ralado. Já as gyozas de vegetais (€6) trazem uma massa fininha, quase como uma folha de papel, vêm suavemente cozidas ao vapor e com um interior macio e saboroso.

    Finalmente as canilhas (€12). Servidas dentro da concha, levemente flambeadas por fora, são uma verdadeira delícia.

    Para acompanhar todo este banquete, pedi o prato da discórdia de seu nome Horenso Gomae (€4,50).

    – Espinafres num restaurante japonês?!, foi a reacção indignada da Família Mistério.

    Sim, espinafres num restaurante japonês, cozinhados à maneira japonesa! E isso é tudo o que pode desejar para equilibrar o festival de peixe. Vêm com um cremoso e levemente crocante molho de sésamo. Feito a partir das sementes de sésamo trituradas, tem um sabor delicioso a frutos secos.

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    O sushi 

    E eis que chegamos ao momento alto do jantar (sim, até agora foi só a fase de preparação): o combinado sushi to sashimi (€38 pelo tamanho médio). Bem servido, com peças grandes e generosas, peixe fresquíssimo e 12 peças de sashimi, o que não está nada mal. Especialmente se tivermos em conta que, entre essas peças de sashimi estavam 3 gordas fatias de chu-toro. Só para ter uma ideia, “toro” significa “derreter” por isso imagine a consistência deste corte único do atum. 

    Também maravilhosos estavam os rolinhos com choco por fora, alga e as imperdíveis ovas de bacalhau por dentro. 

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    A sobremesa 

    Se não há um bolo de chocolate derretido, nada como recorrer a um sushi de atum derretido. E foi por isso que trocámos os doces por um delicioso negitoro (€11,50), um picadinho de atum com cebolinho que estava da outra galáxia. Para partilhar, chegaram ainda uns nigiris de toro que literalmente se derretiam na boca.

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    O serviço 

    Muitíssimo atencioso e ainda mais rápido. Alguns empregados falam muito mal português, o que por vezes complica, mas há sempre alguém disponível para o vir esclarecer.

    O único problema foi mesmo a ordem da vinda da comida: começou pelos gunkans de percebes e só trouxe a entrada de edamame em sexto lugar. Mas tudo isso foi esquecido quando, com a conta, chegou um sempre irrecusável cálice de sake oferecido. E foi ao primeiro golo que me lembrei novamente do sábio provérbio japonês: “Shippai wa seikō no moto”, que é como qualquer português diria “O fracasso é a origem do sucesso”.

     

    O bom 

    As canilhas flambeadas e todo o sushi

    O óptimo 

    Os gunkans de percebes, o Ika Mentaiko, o sashimi de toro e o negitoro

    O mau 

    O couvert

     

    Um óptimo sushi para si onde quer que o sake esteja,

    Ele

     

    fotos: casal mistério; tomo

     

    Nota: Todas as despesas das visitas efetuadas pelo Casal Mistério a restaurantes, bares e hotéis são 100% suportadas pelo próprio Casal Mistério. Só assim é possível fazer uma crítica absolutamente isenta e imparcial. 
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    Tomo

    Largo Comandante Augusto Madureira, 2, Algés

    De 2ª a sábado, 12h30-15h30 e 19h30-23h; domingos só ao almoço

    T: 213 010 705

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