fomos pela primeira vez almoçar a uma esplanada de praia com a regras de distanciamento social

    (Este texto foi originalmente publicado em Junho de 2020, depois do final do primeiro confinamento. Depois do segundo confinamento, de 2021, o Bar do Guincho reabre ao público no dia 7 de Abril, das 12h às 19h.)

     

    Ao fim de 102 dias, 19 horas e 52 minutos, voltei a ver areia. Gostava de dizer que voltei a cheirar a maresia, mas infelizmente a máscara impede-me dessas veleidades. O que para aqui interessa é que enchi o peito de coragem – e enchi a casa de Ben-U-Rons – e ultrapassei a minha hipocondria aguda para cumprir este enorme dever social que é testar anonimamente uma esplanada de praia. Será que cumprem as regras de distanciamento social? Será que toda a gente usa máscara? Será que não tossem para cima de mim? Será que o Benfica vai ser campeão? (Eu sei, isto não tem nada a ver com o tema, mas está na minha lista de dúvidas prementes…)

    A esplanada escolhida foi o Bar do Guincho, em Cascais: praia cheia, self service ao balcão, vento suficiente para levar o vírus e a célebre tradição de dar apenas um beijinho, o que teoricamente pode reduzir o risco de transmissibilidade em 50%. No fundo, todas as condições criadas para fazer a minha experiência social em segurança.

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    As regras 

    Aquela que sempre foi uma esplanada aberta para a praia, está agora transformada numa espécie de discoteca sem música. O acesso à esplanada está reduzido a apenas uma entrada e uma saída, e à porta encontra um porteiro a controlar as entradas. Neste caso, era uma porteira e bastante mais simpática do que os Himalaias que estão à porta do Urban.

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    Mal nos aproximámos, explicou-nos as regras: 

    • Só pode entrar se existir uma mesa vaga – aquele hábito de entrarmos e começarmos a rondar as mesas à espera que alguém se levante para nos sentarmos acabou. Se não houver mesa, tem de esperar no exterior, numa fila em que mantém a distância de 2 metros.
    • Para fazer o seu pedido ao balcão, tem de usar uma máscara. Se entrar directo para se sentar na mesa e só se levantar para sair, não precisa de máscara. Sentado na sua mesa, também não precisa de colocar máscara.
    • O percurso para a fila onde faz o seu pedido está assinalado com autocolantes no chão, onde encontra marcas que asseguram a distância social entre os clientes.
    • Junto ao balcão onde faz o seu pedido, tem um dispensador de álcool gel para desinfectar as mãos antes e depois de fazer o seu pagamento e entregar o cartão multibanco ao empregado. Detalhe importante: o dispensador de álcool gel funciona com um pedal, ou seja, não tem de tocar com as mãos onde toda a gente toca.

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    O ambiente 

    Entrei com a minha máscara devidamente colocada, segundo os sábios conselhos da Dra. Graça Freitas, e sentei-me numa mesa de frente para o mar e acabada de desinfectar. Percebi isso porque, mal um cliente se levanta depois de comer, vem logo um empregado lavar a mesa com luvas, um pano e um frasco de detergente ou desinfectante.

    As mesas davam para um máximo de quatro pessoas e estavam a uma distância razoável umas das outras. Não tive coragem de levar uma fita métrica para confirmar, mas pareceu-me que estavam a cerca de dois metros, se bem que basta alguém sentar-se mais afastado da mesa, com a perna cruzada para alterar as distâncias.

    Ao meu lado estava uma família sentada que me pareceu estrangeira. As crianças ficaram sempre sentadas e bem comportadas e o pai era o único que se levantava, sempre com a máscara colocada (só a tirou para comer). Noutra mesa, um casal mais velho do que eu almoçava tranquilamente com as máscaras no braço para não as pousar na mesa. Toda a gente parecia consciente dos riscos e cumpridora das regras.

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    Até que a porteira se distraiu por um minuto e um senhor sozinho, sem máscara, conseguiu entrar e aproximar-se do balcão. Não havia fila à sua frente por isso seguiu tranquilamente. Mal o empregado do balcão o viu, começou aquele que provavelmente será o diálogo mais comum neste Verão:

    – Pedimos desculpa mas não pode fazer o seu pedido sem máscara.

    – Mas eu deixei-a no carro…

    – Infelizmente, não pode mesmo. Se precisar, pode comprar uma máscara descartável à porta. Custa €0,50.

    – Não vou comprar uma máscara quando tenho uma no carro.

    – Então terá de ir buscar a sua.

    O senhor dá dois passos para trás e dispara a solução genial:

    – E se eu fizer o pedido daqui, afastado? Assim, o vírus não o atinge.

    – Infelizmente, não pode ser. Só mesmo com máscara.

    Numa mistura entre o amuado e o indignado, murmura:

    – Então vou embora.

    O empregado não disse nada, eu mantive-me a assistir: como nos bons jogos de futebol, enquanto a bola rola pode sempre haver uma reviravolta inesperada no marcador.

    O homem saiu da esplanada e deu cerca de dez passos. Parou. Olhou para o mar, olhou para a carteira e voltou para a esplanada. Foi ter com a simpática porteira e pediu para comprar uma máscara. Afinal um almoço de frente para o mar, sem riscos de Covid, é capaz de valer os 50 cêntimos.

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    O serviço 

    Todos estes cuidados de higiene e saúde levam a momentos de tensão, especialmente com quem passa os seus dias a desafiar as regras. E é nesses casos que se percebe a infinita paciência dos empregados. No Bar do Guincho, conseguiram ser sempre simpáticos e pacientes e tentaram ajudar sem quebrar as regras. Mesmo a possibilidade de venderem máscaras a 50 cêntimos (muito mais baratas do que em muitas farmácias) demonstra uma vontade de facilitar sem explorar os clientes.

    Não vi nenhum empregado que estivesse sem máscara – ou com essa nova moda da máscara no queixo – e a maioria tinha luvas. Os tabuleiros usados pelos clientes eram constantemente limpos e as mesas desinfectadas. De resto, os copos são descartáveis e os talheres são entregues com a comida, dentro de uma embalagem de cartão.

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    A comida 

    Ah, e ainda há a comida. Para mim, comem-se no Bar do Guincho algumas das melhores saladas que a praia portuguesa tem para oferecer. Frescas, bem servidas e em grandes quantidades, não sofrem daquele problema comum das saladas nacionais que é o excesso de verdes para a escassez de toppings. Eu adoro a salada de presunto e queijo de cabra (com pêra, melão, presunto, queijo de cabra e mel sobre uma base de alface gourmet e tomate cherry) e a salada de requeijão e mel (com nozes, mel, manga, requeijão e passas – troco sempre as passas por mais nozes sem custos adicionais –  sobre a mesma base). 

    Não são baratas – custam €14 cada uma – mas vêm numa enorme taça. E, melhor de tudo, são servidas em cima do mar.

     

    O bom 

    O serviço simpático e paciente

    O mau 

    A insistência de alguns clientes em não cumprir 

    O óptimo 

    Os cuidados de prevenção

     

    Um óptimo desconfinamento para si onde quer que a praia esteja,

    Ele

     

    fotos: casal mistério e d.r.

    3 comentários em “fomos pela primeira vez almoçar a uma esplanada de praia com a regras de distanciamento social

    1. “Todos esses cuidados de higiene e saúde levam a momentos de tensão “. Por isto, não vou. Prefiro ficar em casa em Lisboa onde se discute a genesis do recrudescimento dos casos. Sou do grupo de risco. Fazemos a salada em casa.

    2. Que coincidência!
      Tb fomos ao Bar do Guincho esta 3a sendo tb a 1a vez a almoçar fora de casa desde março!
      E amei! Comemos hambúrguer e estavam divinais!!
      Todos os cuidados que mencionou, nós tb presenciamos!
      A voltar! ❤

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