Mal reservei o nosso fim de semana neste monte alentejano, transportei-me de imediato para as planícies verdes de Inglaterra onde a realeza pratica estes desportos estranhos. Ah esperem, será criquet? Ou será aquele jogo das Gémeas no Colégio de Santa Clara? “Não, mãe”, corrigiu-me logo um dos nossos filhos, “isso é lacrosse”. Pois é, já não me lembrava.
Mas então afinal o que é o croquet?
Quem melhor para nos explicar do que Pippa Middleton, a irmã da duquesa de Cambridge? Praticante de croquet desde a adolescência, Pippa resume bem o jogo neste artigo que escreveu para a Vanity Fair: “é uma espécie de xadrez na relva: um jogo de estratégia, perícia e tática, ou… só uma desculpa para beber Pimm’s (licor feito à base de frutas) e seduzir”.
De origem irlandesa, o croquet chegou a Londres em meados do século XIX e depressa conquistou a jovem elite britânica até aos dias de hoje. E não só. Desde Winston Churchill a George Clooney e Brad Pitt, já é considerável a lista de famosos que se deixaram seduzir por este desporto.
O croquet é um jogo para dois ou quatro jogadores. O objetivo é marcar pontos acertando as bolas com um martelo através de uma sequência de arcos e contra uma pequena estaca central. Vence o jogo a equipa que acabar primeiro a sequência com ambas as bolas ou aquela que marcar o máximo de pontos num determinado espaço de tempo. Claro que a Família Mistério fez questão de jogar este aliciante e estafante jogo de destreza. Não vou contar quem foi de longe a pior jogadora. Ok, fui eu. Assumo. O jogo requer jeito, pontaria e concentração. Três qualidades que não abundam na minha pessoa. Mas esta é sem dúvida a mais original atração deste pequeno hotel, situado a 3 km de Ferreira do Alentejo.
O hotel
A Quinta da Chaminé é um típico monte alentejano recuperado com cuidado e bom gosto pelos proprietários, a Pilar e o Paco, um casal encantador de Zaragoza que se apaixonou pelo Alentejo. A piscina está muitíssimo bem enquadrada na arquitetura da casa e fica a uma distância de segurança do relvado de croquet, para não perturbar a concentração dos jogadores. Se bem que todo o caminho até ao relvado se faz pelo meio do monte através de um percurso de gravilha, cujo barulho a cada passo não deixa ninguém passar despercebido.
De frente para o relvado, o monte desemboca em dois alpendres com mesas e cadeiras para quem não quiser perder pitada de tão emocionante partida. Um dos alpendres pertence ao hotel, o outro faz parte da casa dos proprietários do monte.
A sala de estar do hotel é grande com alguns recantos para descansar. A decoração é sóbria e elegante, em tons claros com apontamentos coloridos, com um ambiente rústico mas contemporâneo ao mesmo tempo. A grande protagonista é uma imponente lareira entre duas enormes janelas com vista para o relvado de croquet que fez as delícias do meu querido Marido Mistério. Claro que não descansou enquanto não tomou conta da lareira. Acha sempre que precisa de um jeitinho, nem que seja para deslocar ligeiramente um tronco para trás. É claramente um caso patológico.
Os nossos filhos correram para a mesa de matraquilhos. Primeira desilusão das crianças: os matraquilhos estavam encravados, mas lá se conseguiu desencravar. Jogámos o primeiro jogo, mas para jogarmos o segundo era preciso pôr uma moeda de um euro. Revolta na Bounty, indignação geral:
– Bolas, mãe, nós em casa jogamos de graça.
– Pois, é para darem valor ao que têm em casa.
– E agora, o que fazemos sem Internet?
– Vão buscar um livro e leem.
Choque. Pânico. Desespero. Ler um livro? Olharam para mim, incrédulos, como se eu tivesse ensandecido e fugiram de mim como o Diabo da cruz. À chegada, a funcionária que nos recebeu avisou-nos logo que a Internet estava em baixo por causa da tempestade da véspera. Os miúdos fizeram menção de se enfiarem no carro para voltar para Lisboa, tal era o terror da perspetiva de um fim de semana sem Internet. Eu achei ótimo. Ia ser um fim de semana de jogos e leituras em família.
O ambiente, de facto, convida ao descanso, mas tivemos azar logo na primeira noite, porque quando chegámos à sala para tentar ler, um hóspede, forte candidato a sucessor da antiga versão do Fernando Mendes (que agora está estupendo, verdade seja dita) conseguiu afugentar-nos, um por um, até nos refugiarmos nos quartos. O homem estava a ver televisão com o som tão alto, mas tão alto, que cheguei a temer que fosse surdo. Quando finalmente adormeceu, apesar dos decibéis que saíam da televisão, fizemos nova tentativa, mas acabámos a chorar a rir, porque o som da televisão foi substituído por um trovão que nos fez temer o início da Terceira Guerra Mundial. Afinal, o mesmo senhor tinha um sono tão profundo que ressonava no sofá da sala de tal forma que parecia que estávamos sob um bombardeamento feroz.
É claro que os pobres dos donos do hotel não têm culpa nenhuma. É preciso ter uma dose de coragem para abrir as portas de casa a estranhos. É uma autêntica roleta russa. Os hóspedes podem ser uma caixinha de surpresas mas, infelizmente, também são os hóspedes que ajudam a criar, ou não, um bom ambiente. Por isso, o ideal, neste caso, é juntar um grupo de amigos e alugar os oito quartos durante um fim de semana ou na passagem de ano, por exemplo. Assim não corre o risco de ter encontros imediatos do terceiro grau na sala e não ter para onde fugir.
Os quartos
São 8 ao todo. Simples, enormes, muito espaçosos, com armários grandes com arrumação. O nosso tinha duas camas individuais juntas, com uma mesinha de cabeceira de madeira rústica de cada lado, e ainda uma zona de leitura com duas poltronas e uma mesa. O quarto das crianças tinha duas camas em baixo, também juntas, e uma mezzanine com um sofá-cama de casal.
A decoração de ambos os quartos era idêntica: clean em tons neutros e claros, com colchas brancas e cabeceiras beges.
As casas de banho eram modernas e muito giras: conjugam a madeira pintada de branco com o micro cimento afagado, decoradas com escadas rústicas de madeira com grandes e confortáveis toalhões brancos.
As amenities eram boas, cheiravam muito bem, feitas a partir de ingredientes orgânicos e naturais. Os quartos eram aquecidos e tinham ar condicionado. Apenas um defeito a apontar: as camas rangiam cada vez que nos virávamos durante a noite.
O relvado onde se pratica o croquet na quinta da Chaminé é provavelmente a zona mais bem cuidada de toda a casa. Dá para perceber o amor que os proprietários devotam a este desporto de elite.
Os donos têm uma ala privada do monte só para eles mas partilham a cozinha do hotel. São simpáticos, sorriem para os hóspedes, mas pouco mais. Claro que não são obrigados a mais mas o contacto com o público ficou entregue a duas funcionárias esforçadas. E ao pequeno-almoço foi evidente a falta de prática e de à-vontade.
O pequeno-almoço
Sentámo-nos à frente de uma mesa impecavelmente posta na sala principal do monte. A funcionária veio ter connosco e perguntou:
– Querem torradas?
Dissemos que sim enquanto olhávamos em volta. Tínhamos manteiga, azeite e mel em cima da mesa. Menos mal. Na zona do buffet, um prato praticamente vazio com fatias de queijo flamengo e rolinhos de fiambre, duas compotas, iogurtes, sumo de laranja natural e cereais integrais. Havia leite e café. E um bolo do dia.
A funcionária voltou com 4 fatias de pão torrado. Os nossos filhos panicaram e perguntaram logo se podia fazer mais torradas. Respondeu-nos que sim, cada vez mais sisuda. Como deixei de comer pão por causa da minha eterna dieta, arrisquei perguntar:
– Tem ovos?
– Tenho.
– Que tipo de ovos?
– Ovos. Ovos normais.
– Peço desculpa, se calhar, não me expliquei bem. Tem mexidos, estrelados, quentes?
– Tenho todos.
– Então, queria uns ovos mexidos, se faz favor.
E o meu querido Marido Mistério que, claramente, não tem amor à vida, esticou-se e arriscou:
– Eu queria uns ovos quentes, cozidos durante apenas dois minutos e meio. É possível?
Ui. Esperámos com enorme expetativa.
Chegaram mais torradas, os meus ovos mexidos e o ovo quente dele veio assim:
Para quem sonhava com um ovo com casca, colocado dentro de um copinho, para tirar apenas uma pequena tampinha e ir molhando uns palitos de torrada na gema cremosa, podia ser uma desilusão. Para ele, foi uma oportunidade. Para improvisar. E, dois segundos depois, o ovo dele já estava assim:
Ficou radiante e garantiu-me que estava ótimo. Resumindo: o pequeno-almoço cumpre mas não é nada de especial. Tem de ter lata e iniciativa porque senão corre o risco de ficar a olhar para o buffet meio vazio. Se quiser almoçar ou jantar no hotel, tem de avisar com 24 horas de antecedência e conte com €30 por pessoa para um menu único: com sopa, prato principal, sobremesa e bebidas incluídas. Nós comemos uma sopa de legumes boa, um excelente robalo grelhado e uma salada de frutas que não tive barriga para experimentar, tal era o tamanho do peixe que nos serviram. Não se come nada mal, mas o jantar acaba por ser caro para uma família numerosa.
As atividades
O site do hotel promove a praia da Comporta como uma das principais atividades. Eu sei que as distâncias em Espanha são um bocadinho maiores, mas o hotel fica a mais de uma hora da praia da Comporta. Ferreira do Alentejo fica no interior, eventualmente mais próximo do litoral do que de Espanha, mas no meio da planície alentejana. Situa-se ao lado do Ferreira do Alentejo e a cerca de 20 minutos de Aljustrel. Não tem muita coisa para fazer. Se não apanhar hóspedes ruidosos, pode passar aqui um fim de semana relaxado, a ler, a jogar cartas, a apanhar sol na piscina e a jogar croquet. Mas pouco mais. As boas notícias: os preços dos quartos não são muito caros. Os quartos mais baratos são apenas €130 por noite e os mais caros são €140.
O bom
Os quartos
O mau
A pouca variedade do pequeno-almoço
O ótimo
O relvado de croquet
Uma boa escapadinha para si onde quer que esteja,
Ela
fotos: hotel and croquet club quinta da chaminé
Nota: Todas as despesas das visitas efetuadas pelo Casal Mistério a restaurantes, bares e hotéis são 100% suportadas pelo próprio Casal Mistério. Só assim é possível fazer uma crítica absolutamente isenta e imparcial.
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Hotel and Croquet Club Quinta da Chaminé
Estrada N2, Km 3,5, Ferreira do Alentejo
Tel: 0034 673 743 596 (sim, o número de tel. é espanhol!)