Primeiro foi o corpo da Jessica Athayde, agora é a cara da Renée Zellweger, amanhã será o cabelo do Fernando Ruas. E qual é a melhor maneira de fugir a estes temas de fundo que mobilizam a sociedade portuguesa? Enfiando-me a jantar numa esplanada junto ao rio, para aproveitar o Verão fantástico que aí está em Outubro.
E foi com o calor de Verão no corpo e a imagem de Fernando Ruas na cabeça que entrei na esplanada do Station, no Cais do Sodré, em Lisboa. Mal me sentei, com quase 30 graus, a uns metros de distância da mesa onde Mick Jagger já jantou, pedi um gin tónico Bombay Saphire só com limão (€8). Ela preferiu um mais elaborado Hendricks com pepino (€12).
O ambiente
O Station está dividido em dois andares. No de baixo, está o restaurante, com uma parte coberta e protegida por enormes janelas que dão para o rio, e uma muito simpática esplanada que estava cheia (graças a Ela, marcámos). No andar de cima, há uma discoteca, com música ligeiramente desadequada para a minha idade: mal entrei, comecei a sentir-me o Fernando Ruas a dançar, sem saber muito bem qual o movimento do bigode mais adequado àquele som.
Sendo um bar, tem uma vantagem rara hoje em dia: a maioria dos clientes sabe o que foi o Verão Azul, o que não nos faz sentir como o Avô Cantigas rodeado de crianças por todos os lados. No entanto, ainda não percebi se é por teimosia ou mau feitio, não me consigo adaptar à música que passa, mesmo nas discotecas para trintões e quarentões, como o Station.
Na zona do restaurante, a decoração é simples e despojada, animada apenas por um jogo de luzes que dá cor à sala. O melhor é claramente a esplanada, com um simpático deck de madeira e cadeiras confortáveis, que dá directamente para o rio – e para o terminal dos barcos (esta parte dispensávamos…). Nas noites mais frias, uns discretos aquecimentos ajudam a subir a temperatura ambiente – isto, se os gins não forem suficientes.
A ementa
Se está à espera de comida tradicional, dê meia volta e regresse à casa de partida. O Station é um restaurante que mistura vários sabores orientais com vários sabores orientais e, ok, duas ou três coisas que nasceram para cá de Istambul.
As entradas
Mal pousámos a lista, trouxeram-nos um shot de gaspacho de pepino oferecido pelo chef (é sempre simpático colocar a coisa nestes termos). Depois, dividimos vários pratos para tentarmos sofregamente provar o mais possível.
Começámos com um carpaccio de novilho braseado com soja, sementes de sésamo e azeite de trufas (€10) que estava fantástico. O que à partida pode parecer uma ousadia – misturar a soja com as trufas – resulta lindamente. Depois atirámo-nos que nem hienas famintas a um maravilhoso tártaro de salmão com gengibre, soja e cebolinho (€8,50). O que torna este tártaro excepcional são as chips de wan tan que o acompanham. Folhas finíssimas de uma massa feita com farinha de trigo e ovos, é um prato típico de Cantão e aqui é servido ultra-estaladiço.
Os pratos principais
Como íamos com o irmão Dela e com a futura cunhada, numa espécie de iniciação ao maravilhoso mundo do Casal Mistério – comida, comida, comida e muitos gins tónicos –, aproveitámos a superioridade moral que a idade nos concedia para os forçar a pedir vários pratos a dividir por todos. Como qualquer noiva prendada na arte de agradar aos cunhados mais velhos, aceitou logo com um entusiasmo bem disfarçado.
Veio, então, primeiro uma salada thai de lulas e vieiras (€12) que só provou que é possível comer óptimas e frescas vieiras por preços que não são exorbitantes. Apesar de ser bastante picante, estava muitíssimo agradável.
A seguir, chegou um filete de atum braseado com salada thai (€18), fresco e feito no ponto, e um phad thai de frango e camarão com amendoim torrado (€15). Feito com massa de arroz, este é um dos pratos mais populares na Tailândia. Ela adorou e a futura cunhada também, mas eu confesso que foi o prato que menos gostei. O festival acabou com um delicioso caril vermelho tailandês de marisco (€18). Vinha com camarão, vieiras e lulas e trazia um molho não muito picante que me deixou com a boca aberta de espanto – e também de alguma falta de ar provocada pelo excesso de comida.
As sobremesas
No entanto, a comida nunca é de mais para impedir uma boa sobremesa no final. Mas quando digo boa, é boa. E não foi o caso. A pannacotta de leite de citronella e maracujá (€5,50) só me ajudou a convencer de que, de facto, não gosto de pannacotta. Safou-se uma banana caramelizada com creme brulée e gelado (€6,50) que Ela atacou com uma ferocidade invejável, mas da qual eu já não tive coragem de me aproximar. Fiquei-me pelo café Nespresso, que esse não traz surpresas.
O serviço
Ah, esqueci-me do couvert! Não, não fui eu. Foi mesmo o empregado. Nós só nos lembrámos quando a conta chegou com quatro couverts incluídos. Chamei a atenção para o engano e recebi como resposta perto de uma dezena de pedidos de desculpa que me perseguiram até à porta de saída.
Por mim, as desculpas já tinham sido dadas pela simpatia e pela disponibilidade ao longo de todo o jantar. Eu, que não sou propriamente especialista em comida oriental, preciso desesperadamente de ter alguém que me conduza pela ementa como meu guia espiritual do alimento. E o empregado do Station foi isso. Com uma paciência de santo, respondeu a todas as perguntas sobre os ingredientes, a quantidade de comida ou o grau de picante. Conhecia bem a cozinha e percebeu lindamente aquilo de que gostávamos. Até da pannacotta me tentou dissuadir em vão.
As crianças
A não ser que os seus filhos já estejam habituados a ir comprar bolos depois de uma noite de copos, este não é um restaurante para eles. Além de não ter menu infantil, não tem ambiente infantil. Pelo menos de noite. Acredito que, ao almoço, as coisas possam ser ligeiramente diferentes.
O bom
A esplanada em cima do rio
O mau
A pannacotta
O óptimo
O tártaro de salmão com chips de wan tan
Um bom Verão para si onde quer que o Outono esteja,
Ele