A primeira coisa que vê quando chega ao novo Puro 4050, no Porto, é o pão. Não é que a porta da entrada esteja enfeitada com uma coroa de papo-secos, é que a sala está inundada por um irresistível cheiro a pão quente, acabado de tostar, que lhe permite visualizar, de olhos fechados, cada migalha a estalar na sua boca ao mínimo contacto com os dentes.
Eu sei, posso estar a precisar urgentemente de tratamento psiquiátrico – é o que a minha querida Mulher Mistério não se cansa de me repetir – mas é mais forte do que eu. Passados alguns dias, ainda sonho com aquele cheirinho a pão quente a estalar-me na boca. E esse é o melhor resumo do Puro 4050. Inaugurado no Porto, no Verão passado, este não é bem um restaurante clássico.
Dos mesmos donos do fantástico Cantina 32 – de que falei aqui –, o Puro 4050 tem a ementa dividida em duas grandes partes: petiscos italianos, quase todos com mozzarella, e meia dúzia de pratos mais a sério: carnes, massas e risottos. Como nós fomos lá almoçar em modo Família Mistério – que é o mesmo que dizer muitas bocas com ainda mais vontade de comer – optámos essencialmente pelos petiscos de mozzarella. E é aí que entra o pão: quente, tostado ou em forma de focaccia, é fundamental para acompanhar os petiscos. Mas já lá vamos. Antes é preciso falar de…
…O ambiente
Não é só o cheiro a pão quente que transforma este num ambiente tão acolhedor quanto um sofá com uma manta de xadrez, à frente de uma lareira, num dia de chuva. A decoração do espaço também é apetecível. Além da cozinha tranquila e aberta para a sala, com pão, focaccias, queijos, presuntos e um parmesão gigante – que está para um restaurante italiano como um quadro do Picasso está para um museu – há também mapas e fotografias antigas espalhadas por todo o lado.
No andar de baixo, encontra uma mesa gigante onde se pode sentar um grupo ou vários casais com poucos temas de conversa e que queiram conhecer gente diferente. E estantes. E livros. E antiguidades. No fundo, parece quase que está em casa. Até as casas-de-banho são imperdíveis. As portas dos homens e das senhoras estão identificadas com fotografias de dois contemporâneos do meu avô Pompílio. E o lavatório é uma peça de loiça pintada.
Depois, ainda tem uma esplanada interior e outra que dá para o Largo de São Domingos, mas esse não é tema para esta altura do ano.
A ementa
Quando chegámos, trouxeram-nos logo a ementa. Talvez por causa do ar erudito da minha querida e estimada Mulher Mistério, deram-nos uns generosos 15 minutos para ler uma simples página antes de recolherem os pedidos e trazerem a primeira grande surpresa da tarde.
O couvert
Manteiga de búfala. Aqui, até a manteiga do couvert tem ligações familiares com a mozzarella. Feita com leite de búfala DOP, leva ainda uns finos flocos de flor de sal por cima. O discreto sabor a queijo fresco torna esta manteiga num verdadeiro vício. Especialmente se for espalhada numa fantástica chapata estaladiça. Para compor o couvert (€1,50 por pessoa), trazem-lhe ainda um pratinho com um delicado azeite extra-virgem.
Nós não resistimos também a pedir um extra: uma degustação de três variedades de azeitonas (€6) que vem com umas azeitonas enormes verdes com pesto por cima (para mim eram as menos interessantes), umas pretas em azeite e bem tenrinhas e outras pequenas pretas também muito macias e saborosas.
As mozzarellas
E eis que chegamos finalmente àquilo que faz do Puro 4050 um restaurante único. Logo a abrir a ementa, tem sete opções diferentes de mozzarella. Pode escolher só uma ou pode pedir uma degustação. Depois, pode combinar a sua mozzarella com saladas, charcutarias italianas, carnes cruas, azeitonas, queijos, patés, vegetais… cada cliente constrói a sua refeição como preferir à volta da sua mozzarella.
Se não estiver para pensar muito no assunto, pode optar por uma das cinco combinações sugeridas pelo chef ou por uma das seis focaccias com diferentes tipos de mozzarella.
Nós optámos por uma degustação de mozzarellas (€19) que traz uma mozzarella clássica com 125 g, uma mozzarella afumicata com o mesmo peso e uma burrata com 200 g. E sempre que falo de burrata começo a ver a minha boca transformar-se num pequeno Oceano Atlântico. A burrata é quase o queijo perfeito. Feita de mozzarella por fora e de manteiga por dentro, é fresquíssima, suave e muitíssimo cremosa. Mas o melhor de tudo é que o exterior é consistente e o recheio cremoso, quase líquido, por isso quando lhe dá o primeiro golpe com a faca o seu prato transforma-se quase num rio de lava feito de manteiga.
Aliás, todas as mozzarellas estavam óptimas, aquela de que eu menos gostei foi da afumicata que vinha com o exterior encarniçado e o interior branco e macio, mas que tinha um sabor intenso demais a fumado que acabava por ofuscar o queijo.
A acompanhar estas delícias, pedimos um presunto de Parma (€5,50) fininho mas muito mais seco do que um bom pata negra – quase não se sente gordura – e um creme de alcachofras grelhadas (€3,50) que estava delicioso e com o sabor muito acentuado: ainda se sentiam os fios de alcachofras no meio da pasta cremosa. Por cima, traz um fio de azeite e meio coração de alcachofra grelhado.
Antes de passarmos aos outros petiscos, ainda experimentámos uma das combinações sugeridas pelo chef: um creme frio de tomate com burrata, azeite e manjericão (€10) que é quase uma sopa fria de tomate com uma burrata gigante no topo. Estava agradável, mas achei o creme de tomate ligeiramente enjoativo.
Para acompanhar todo este festival de mozzarellas, pedimos uma fantástica foccaccia que vem fininha e estaladiça com uma cobertura que mistura cogumelos porcinni e portobello com mozzarella, uma ricotta cremosa e um fantástico aroma a trufas que deixou os meus queridos Filhos Mistério praticamente em êxtase.
As carnes
Para acabarmos o almoço, tivemos de pedir duas carnes que ajudaram a quebrar o excesso de queijo: um carpaccio (€11) bom e fininho com bolinhas de mozzarella, rúcula, pesto e umas lascas quase transparentes de tão fininhas de parmesão, acompanhado por uma fatia de focaccia; e um tataki de novilho (€8,50) absolutamente divinal.
A carne vem bem marcada por fora e muitíssimo rosada por dentro, com um irresistível sabor a tostado e uma textura macia e suculenta. Por cima, trazem-lhe uns fabulosos cogumelos shimeji pequeninos e um fantástico molho de trufas – eu não disse que as crianças adoram trufas?
As sobremesas
Felizmente, não havia sobremesas com trufas por isso dividimo-nos entre um delicioso e consistente salame com frutos secos e biscoitos de Amaretto (€3,50) e uns menos interessantes profiteroles com mousse de maracujá (€3,50).
O serviço
Foi sempre muitíssimo simpático, sorridente e disponível. Mas claramente demorado demais. No início, levaram 15 minutos entre a chegada da ementa e a recolha dos pedidos. E, no final, já com pouca gente no restaurante, a demora repetiu-se. Mal acabámos de comer, vieram levantar os pratos. Mas depois os empregados desapareceram misteriosamente durante 20 minutos. Só aí é que conseguimos chamar alguém para trazer a lista das sobremesas.
As crianças
Não tem menu infantil, mas por €6 tem uma combinação com focaccia clássica (alecrim e flor de sal), tostas de focaccia e ciabata, tapenade de azeitonas, húmus e lascas de parmesão. Pode ser interessante, mas falta o essencial: as deliciosas mozzarellas.
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O bom
A decoração original
O mau
A demora do serviço no início e no fim do almoço
O óptimo
Todo o conceito da ementa, e especialmente a mozzarella e o tataki de novilho com cogumelos
Um óptimo almoço para si onde quer que a mozzarella esteja,
Ele
fotos: puro 4050; casal mistério
Nota: Todas as despesas das visitas efetuadas pelo Casal Mistério a restaurantes, bares e hotéis são 100% suportadas pelo próprio Casal Mistério. Só assim é possível fazer uma crítica absolutamente isenta e imparcial.
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Puro 4050
Largo de São Domingos, 84, Porto
Das 12h30 às 15h00 e das 18h30 às 23h;
Fecha ao domingo
T: 222 011 852